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E-mail enviado a pesquisadores
da Região Nordeste
Luiz Carlos Bresser Pereira

Prezado Pesquisador,

Minha entrevista ao jornal da SBPC, Ciência Hoje, continua a repercutir negativamente. Já ficou claro que jamais usei a expressão "capim" e sim "carro". O jornalista já admitiu o seu erro. Perguntado pelo repórter porque o Nordeste recebia relativamente menos bolsas do CNPq (em relação à sua população), procurei dar a resposta mais clara e franca possível, não fui cuidadoso em medir as palavras, e acabei sendo completamente mal interpretado. Imediatamente escrevi uma nota, que enviei aos deputados e  senadores que me trouxeram o problema, além de colocá-la na home page do MCT. Agora decidi enviar-lhe diretamente a nota, anexada, complementando-a com algumas informações.

Jamais disse que no Nordeste não existam excelentes pesquisadores, de nível internacional. Existem, e muitos - um deles foi e é um dos meus grandes mestres, o prof. Celso Furtado. No meu presente posto tenho, sempre que possível, pedido a colaboração de um dos mais importantes físicos do país, Sérgio Rezende. Jamais disse que garantir apoio a pesquisadores do Nordeste seria jogar dinheiro fora, ou tirar dos competentes e dar para os incompetentes. Disse apenas que se estabelecêssemos quotas para cada região, estaríamos, sim, abandonando o critério de excelência que é defendido também pelos pesquisadores do Nordeste que fazem parte dos Comitês Assessores. O de julgamento por pares é universalmente usado pelos Conselhos de Pesquisa de todos os países. Era somente a essa questão da forma de alocação geral das bolsas a que estava me referindo. Jamais pensei estar relegando papel x ou y ao Nordeste.

Ao contrário, desde que assumi essa pasta venho tentando pensar programas de Desenvolvimento Regional visando corrigir alguns dos terríveis desequilíbrios hoje existentes. O CNPq possui o Programa Nordeste, que já renovei. Esta é uma forma importante de estimular a pesquisa na região. Além disso espero obter, como digo em minha nota, recursos adicionais para a região através de financiamento do BID.

Algumas pessoas têm dito que sou elitista, que manifestei preconceito em relação ao Nordeste. Nada mais longe de mim do que isto. Não apenas porque seria contra meus princípios. Também porque é contra a realidade de uma plêiade de pesquisadores e, mais amplamente, de intelectuais nordestinos que honram o Brasil.

Peço, de qualquer forma, desculpas pelo mal-entendido que provoquei.

Cordialmente,

Luiz Carlos Bresser Pereira
Ministro de Ciência e Tecnologia

Nota referida pelo Ministro

Vários amigos nordestinos telefonaram-me, entre indignados e surpresos, com uma entrevista que dei ao jornal da SBPC, Ciência Hoje, no qual, referindo-me ao problema do gasto relativamente menor do Governo Federal em ciência e tecnologia na região, dizia que não se deveria colocar o "capim" na frente dos bois (veja esclarecimento). Mais indignado fiquei eu, porque jamais usei tal expressão, que, aliás, não faz sentido – ou só faz sentido se a pensarmos de forma injuriosa. Disse sim, usando uma expressão bem conhecida, que não se deve "colocar o carro na frente dos bois". Este esclarecimento já está feito na página da internet do MCT.

Desde que assumi o MCT, tenho dado uma prioridade especial ao Nordeste. Se não contarmos a cidade do Rio de Janeiro, onde esse ministério vários centros de pesquisa e a FINEP, Fortaleza foi a primeira, e – até agora – uma das únicas capitais de Estado que visitei como Ministro da Ciência e Tecnologia. Fiz a visita para prorrogar e ampliar um programa de difusão tecnológica que o ministério vem realizando com o Governo do Estado do Ceará. Como considero esse programa excelente, já estou tomando providências junto ao BID para conseguir financiamento para estender o programa para os demais estados da região.

Meu apreço pelo Nordeste vem de longa data. Um apreço que não deriva apenas da solidariedade por uma região que tem sofrido as conseqüências duras de estar localizada em grande parte em uma região semi-árida. Vem também da admiração que tenho pela fibra dos nordestinos, por sua capacidade empresarial, artística e científica. Muitas vezes é o desafio representado pelas condições adversas da natureza, que estimula as grandes realizações.

Existe, porém, um problema concreto: as bolsas de pesquisa que o MCT distribui, através principalmente do CNPq, são, proporcionalmente à população, em menor quantidade do que para o resto do país. Por que? Basicamente em função do fato de que o CNPq, seguindo nesse sentido a linha de todos os conselhos de apoio à ciência existentes no mundo, distribui as bolsas de acordo com a qualidade dos projetos que os grupos de pesquisa que os apresentam.

Quem julga essa qualidade? Os próprios cientistas, através de um sistema que chamamos de "avaliação de pares". Para cada uma das 35 áreas temáticas em que está dividida a ciência no Brasil, temos um Comitê Assessor composto de cerca de 4 cientistas de reconhecida competência. Como o Nordeste contam com excelentes cientistas, temos nos comitês 18 cientistas provenientes de universidades e institutos isolados de pesquisa da região. Os comitês recebem as propostas dos seus pares, ou seja, dos demais cientistas, e as julgam segundo o critério de excelência científica. Como têm uma quota de bolsas limitadas, em geral aprovam cerca de metade dos pedidos. O próprio ministro e os vice-presidentes do CNPq não interferem no processo.

Dada a natureza do processo, e não obstante o número de cientistas do Nordeste nos Comitês Assessores, o Nordeste recebe relativamente menos do que o resto do país em termos de bolsas. Recebe 14 por cento das bolsas, quando conta com 28,5 por cento da população.

Que fazer diante disto? Mudar o sistema de julgamento por pares que é essencial para o progresso da ciência no Brasil? Isto seria colocar o carro na frente dos bois, e usar mal o dinheiro público. Os próprios bons cientistas do Nordeste não concordariam. A solução mais geral é conhecida por todos nós. É desenvolver mais o Nordeste. É realizar investimentos maciços em educação.

Dentro do âmbito específico do MCT é também possível agir, e, de fato iniciativas estão sendo permanentemente adotadas. Como resultado, o investimento em bolsas de estudo e de pesquisa no Nordeste, nos últimos quatro anos (de 1995 a 1998) aumentaram em 10 por cento em termos reais, enquanto que caiam 29 por cento no Sudeste e 17 por cento no Sul (tabela 3).

Por outro lado os apoios do MCT à pesquisa não se limitam às bolsas do CNPq. Através do FNDCT e da FINEP, o ministério tem procurado dar sempre uma atenção especial à região. E o próprio CNPq desenvolveu, juntamente com a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Ceará, o programa de difusão científica e tecnológica, que atende as regiões mais pobres do estado. É esse programa que espero poder ampliar para toda a região nordestina, a partir do momento em que consigamos recursos adicionais, que provirão provavelmente do BID, com o qual já estou em entendimentos.

Investimentos em Recursos Humanos e Pesquisa (R$mil)
1995 a 1998

Tabela 1
Bolsas no País

Região

1995

1998

Crescimento %

Norte

6.441,2

9.323,4

45%

Nordeste

39.687,6

42.199,7

6%

Sudeste

284.828,3

221.355,5

-22%

Sul

60.026,2

51.064,8

-15%

Centro-Oeste

22.412,3

24.694,2

10%

Outros

385,2

16,1

-96%

Total

413.780,8

348.653,7

-16%

Fonte: MCT/CNPq
Nota: Outros = bolsistas sem vínculo; instituições no exterior

Tabela 2
Fomento à Pesquisa

Região

1995

1998

Crescimento %

Norte

310,7

1.090,3

251%

Nordeste

2.968,0

7.016,5

136%

Sudeste

15.378,7

13.410,2

-13%

Sul

4.203,8

4.547,7

8%

Centro-Oeste

1.919,5

4.118,8

115%

Outros

12.510,6

1.094,0

-91%

Total

37.291,3

31.277,5

-16%

Fonte: MCT/CNPq
Nota: Outros = bolsistas sem vínculo; instituições no exterior

Tabela 3
Bolsas de Estudo - Bolsas de Pesquisa - Fomento à Pesquisa

Região

1995

% do total 1995

1998

% do total 1998

Crescimento % (1995/98)

Norte

7.286,3

1,52%

10.925,3

2,76%

33%

Nordeste

45.967,7

9,59%

51.358,6

13,00%

10%

Sudeste

313.665,90

65,44%

242972,2

61,49%

-29%

Sul

69.475,9

14,50%

59.423,3

15,04%

-17%

Centro-Oeste

26.116,0

5,45%

30.438,4

7,70%

14%

Outros

16.781,6

3,50%

16,1

0,00%

-104134%

Total

479.293,4

100%

395.133,9

100%

-21%

Fonte: MCT/CNPq
Nota: Outros = bolsistas sem vínculo; instituições no exterior